Somos o nosso próprio passado.
Dormem soterradas nos tenebrosos porões do inconsciente as
razões das nossas angústias de hoje, tanto quanto estão em nós as conquistas
positivas, que lutam por consolidar-se na complexidade da nossa psicologia,
tentando suplantar os apelos negativos que insistem em infelicitar-nos.
Estamos a caminho da redenção quando damos apoio consciente
às tendências do bem em nós, quando estimulamos, com as nossas lágrimas, e cultivamos,
com amor e sofrimento, as sementeiras da paz.
Se, ao contrário, nos deixamos dominar pelas sombras que
trazemos no íntimo, paramos no tempo, enquanto se aprofundam em nós as raízes
do desequilíbrio, no terreno fértil das paixões que julgamos tragicamente
indomáveis, quando são, simplesmente, indomadas. É preciso saber que cabe a nós
— e a ninguém mais — domá-las; mas, enquanto nos apraz o erro, todo o nosso
esforço é posto na tarefa inglória de manter soltas as paixões, e presas as
recordações.
Hermínio de Miranda - in "Diálogo com as sombras"
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